Após meses de pressão, Governo Federal reativa Memórias Reveladas, mas destino de banco de dados é incerto
Ano VI – Edição 278
Depois de meses de denúncias e pressão, o Governo Federal reativou o Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil, mais conhecido como Memórias Reveladas (MR). O centro foi convertido em uma divisão do Arquivo Nacional no início do Governo Lula e vinha sendo paulatinamente abandonado desde 2016. O Giro tratou do caso em duas edições (em fevereiro e em abril).
A “reativação” – na verdade uma quase refundação – aconteceu no dia 8, através de uma portaria publicada pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI). A deliberação estabelece que o Memórias Reveladas deve ser um “espaço de convergência e difusão de documentos ou informações produzidos ou acumulados sobre o regime político que vigorou no período de 1º de abril de 1964 a 15 de março de 1985”. O “regime político”, todos sabem, é a ditadura civil-militar, expressão que não aparece em nenhum momento da portaria.
Entre os objetivos do MR estabelecidos pelo MGI está a atribuição de “promover amplo acesso às fontes de informação e de conhecimento, por meio de banco de dados do Sistema de Informação do Arquivo Nacional (Sian), bem como de página no portal do Arquivo Nacional”. Não há qualquer menção ao banco de dados do próprio Memórias Reveladas, que não está no Sian. O destino do banco de dados mantido até hoje pelo MR – um dos maiores legados do centro – é incerto.
Além da portaria de reconfiguração do Memórias Reveladas, o MGI também instituiu um Grupo de Trabalho “com o objetivo de propor ações de articulação institucional voltadas à promoção do direito à memória em apoio às ações e aos projetos desenvolvidos por meio do Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil - Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos”. Liderado pelo AN, o grupo deverá analisar documentos produzidos pelas equipes técnicas do MR e promete apresentar, em até seis meses, um relatório final que deve subsidiar a elaboração de um “Plano de Articulação Institucional para o Centro”.
No dia 9, o Arquivo Nacional nomeou os integrantes da Comissão de Altos Estudos do MR, um grupo formado por 30 especialistas que tem por objetivo “aproximar o Centro de Referência da comunidade acadêmica, promovendo a produção de artigos acadêmicos e de difusão científica, pesquisas e concursos monográficos”. A nominata dos indicados para a Comissão conta com pesquisadores altamente qualificados na área, mas não condiz com as áreas relacionadas em um dos objetivos mais importantes do MR: “estimular a pesquisa sobre o regime político […] nas áreas da Antropologia, Arquivologia, Biblioteconomia, Ciência da Informação, Ciência Política, Comunicação Social, Direito, História, Letras, Museologia, Relações Internacionais e Sociologia, entre outras”. Dos 30 indicados, 21 são historiadores (70% do total). E, diferentemente de outras configurações do Centro, não há um só pesquisador ou especialista da área de Arquivologia. Na quinta, 16, a nova Comissão de Altos Estudos se reuniu pela primeira vez.
Na segunda, dia 13, o Arquivo Nacional também lançou a mais nova edição do Prêmio Memórias Reveladas, interrompido desde 2017. O concurso, que antes premiava trabalhos acadêmicos (dissertações e teses) sobre o tema da ditadura, agora terá três categorias: artigo acadêmico, projeto pedagógico e material de comunicação. As inscrições do prêmio começaram ontem e vão até 23 de agosto.
Para celebrar o “retorno” do Memórias Reveladas, o Arquivo Nacional promoveu ontem, 20, uma live com integrantes da Comissão de Altos Estudos, do Grupo de Trabalho e da direção do AN. Somente membros da direção do AN (logo, comissionados) foram convidados a integrar as mesas do evento – que conta, ainda, com a participação de Carla Lopes, servidora aposentada da instituição que integrou o Centro anos atrás.
Enquanto no maravilhoso mundo do Diário Oficial da União e da propaganda oficial tudo parece avançar às mil maravilhas, servidores do Arquivo Nacional ouvidos pelo Giro afirmam que, por ora, nada de objetivo aconteceu com o Memórias Reveladas. O Centro permanece acéfalo, os dois únicos servidores designados para a divisão encontram-se em licença médica e a sala onde funciona o Memórias Reveladas está fechada desde março. O conhecido logotipo do centro foi alterado, mas o sítio do MR não é atualizado desde outubro de 2022.
HONÓRIO
Para quem ainda não sabe, o Giro da Arquivo é um projeto do Honório – Grupo de Pesquisas em Políticas Públicas Arquivísticas. O Honório é formado por especialistas que analisam temas relacionados às políticas públicas arquivísticas em suas múltiplas dimensões. Recentemente, começamos a publicar algumas destas análises através de nossas Notas Técnicas.
Na semana passada, lançamos nosso mais recente número, intitulado Projeto de Lei n.º 6.228/2023 e os acervos presidenciais brasileiros: potenciais avanços e desafios a superar. A nota é assinada pelo professor Renato de Mattos.
Vale a leitura!
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BRASIL
À medida que as águas baixam, o Rio Grande do Sul se depara com o impressionante rastro de destruição deixado pela maior tragédia humanitária da história do Estado. Como mostramos nas últimas semanas, os arquivos não passaram incólumes ao desastre. Nesta semana, uma reportagem do UOL mostrou como os arquivos de cartórios estão entre os mais afetados pela catástrofe – e como isso poderá prejudicar o futuro do Estado.
Em Eldorado do Sul, uma das cidades mais atingidas pela enchente, temor e consternação cercam um acampamento do Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST), onde parte do acervo da ex-presidenta Dilma Rousseff estava guardado. Segundo informações preliminares, o acervo teria sido inundado.
A mobilização em torno de iniciativas de recuperação de acervos perdidos segue tomando forma. Na última quinta, 16, o Ministério da Cultura reuniu mais de 80 profissionais em um encontro virtual que criou a Rede para Mapeamento e Recuperação do Patrimônio Material, Acervos Museais e Arqueológicos e Arquivos no Rio Grande do Sul. Ontem, uma iniciativa similar foi realizada pelo Arquivo Nacional.
No universo digital, a situação do RS também é crítica. A Procergs, empresa de processamento de dados do Estado, precisou suspender suas operações há quase duas semanas, tirando do ar todos os sistemas essenciais. Para que se tenha uma ideia, serviços ligados ao trânsito, à educação e até mesmo à emissão de carteiras de identidade estão inacessíveis. E o pior: a normalização só deve acontecer no final do mês.
Cá no Giro, comemoramos muito quando uma cidade ganha seu arquivo. Na semana passada foi a vez do município de Timóteo, em Minas Gerais. Uma lei aprovada na Câmara de Vereadores criou o Arquivo Público Municipal.
AGENDA
Hoje, 16h, online: Oficina Organização e preservação de acervos fotográficos.
27/05, no Rio: Oficina para professores: os documentos na sala de aula.
Ao longo do mês de junho, online: Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul apresenta série de cursos com renda revertida às vítimas da tragédia no RS.
17 a 21/06, online: Arquivologia Solidária – Apoio aos Arquivos no Rio Grande do Sul.
06 a 08/08, no Rio: submissões abertas para o I Encontro de Arquivo, Cultura e Justiça Social.
OPORTUNIDADES
Concursos abertos para arquivista da Prefeitura de Marechal Cândido Rondon (PR), para o COREN-PR, para o CRF-RS, para a Universidade Federal de Rondônia.
A Associação Brasileira de Preservação Audiovisual, juntamente com a Universo Produção, oferta bolsas de apoio para estudantes que queiram participar do Encontro Nacional de Arquivos e Acervos Audiovisuais Brasileiros, durante a 19ª Mostra de Cinema de Ouro Preto.
MUNDO
Nos Estados Unidos, o National Archives está procurando voluntários para “decodificar” registros de pensões do tempo da Guerra de Independência do país.
Lá como cá… Na terça passada, um grupo de profissionais realizou um protesto em frente à Biblioteca Nacional de Wellington, na Nova Zelândia. O motivo? O fim do programa de digitalização dos arquivos do país.
No Peru, ex-chefes do Archivo General de la Nación denunciam a transferência de documentos históricos para um galpão sem condições mínimas para preservar os registros.
No Equador, foi lançada a Norma Técnica Ecuatoriana de Descripción Archivística.
Lançado no Chile, na semana passada, o livro Chile y sus archivos : historia y políticas de protección del patrimonio documental, de María Elena Marta Iduarte Cofré.
E, na Argentina, o primeiro curso de Capacitación Archivística da Escuela de Archivología de Córdoba, uma das mais importantes do continente, comemorou 50 anos.
PARA LER COM CALMA
Movimento Negro Evangélico pede às igrejas a abertura de arquivos da escravidão (via Alma Preta).
Entropia: o limite que o Universo impõe à compressão de arquivos (via Super Interessante).
Archie, o primeiro buscador do mundo, é recuperado e volta para a internet (via TecMundo).
PARA VER COM CALMA
XXV JORNADA ARQUIVÍSTICA DA UNIRIO – 2014, com homenagem a Marilena Leite Paes (via REVIS-ARQ Grupo de Pesquisa).