Entidades da Arquivologia e da História se manifestam sobre paralisia do Memórias Reveladas
Ano VI – Edição 263
Prestes a completar seu sexagésimo aniversário, o Golpe Civil-Militar de 1964 voltou à pauta de arquivistas e historiadores. Na terça, 30, o blog Ponto de Vista, mantido pela Associação de Arquivistas de São Paulo (ARQ-SP) publicou “A paralisação do Memórias Reveladas e os 60 anos do Golpe Militar”. O artigo denuncia a “morosidade” do Arquivo Nacional em recompor os trabalhos do Centro de Referência das Lutas Políticas No Brasil (1964-1985): Memórias Reveladas.
O Memórias Reveladas surgiu em 2009, com o propósito de dar acesso aos arquivos da ditadura de 64 e das múltiplas ações de resistência ao regime. Coordenado pelo AN, o centro mantém uma base de dados sobre instituições e acervos referentes ao tema, além de um Prêmio de Pesquisa destinado a dar visibilidade a trabalhos que utilizem fontes documentais do período entre 1964 e 1985. O Centro já promoveu eventos, exposições e editou publicações sobre a temática.
Durante o governo de Jair Bolsonaro (2019-2022), a iniciativa sofreu uma série de ataques. Como ressalta a ARQ-SP, naquele período “o Memórias Reveladas foi alvo de inúmeras denúncias públicas sobre a tentativa de esvaziamento de suas atividades”. Além de ter sido institucionalmente rebaixado, o Centro também viu interrompidas ou prejudicadas as atividades relativas à disponibilização de acervos e a publicação das obras agraciadas com a edição de 2017 do Prêmio Memórias Reveladas.
A nota da ARQ-SP aponta que, mesmo depois do Governo Bolsonaro, a situação do Memórias Reveladas não melhorou. Conforme a associação, “a) os órgãos colegiados que compõem o Memórias Reveladas, e que possuem um papel fundamental na elaboração de projetos de difusão e de produção de conhecimento sobre o período da ditadura militar do país, não foram compostos ou convocados pela atual gestão do Arquivo Nacional; b) na nova estrutura do Arquivo Nacional, aprovada pelo Decreto nº. 11.874, de 29 de dezembro de 2023, o Memórias Reveladas manteve-se subordinado à área voltada ao tratamento técnico do acervo sob a guarda da instituição arquivística, reforçando o esvaziamento político que o Centro de Referência vem experimentando desde 2016; c) de maneira semelhante, não houve, até o momento, uma nova edição do Prêmio de Pesquisa Memórias Reveladas, cuja periodicidade deveria ser bienal”.
Na sexta, 02, a Seção do Rio de Janeiro da Associação Nacional de História veio a público “se solidarizar com o projeto Memórias Reveladas, uma experiência de tratamento e acesso a acervos em rede”. Em nota, a ANPUH-RJ lamentou “que uma documentação que cumpre a missão da pesquisa histórica e da comprovação de Direitos não esteja recebendo a atenção devida e necessária”.
Na edição de domingo, 04, d’O Globo, a coluna de Lauro Jardim explorou com mais detalhes a situação do Memórias Reveladas. De acordo com a matéria, “depois de 13 milhões de páginas federais escaneadas, com destaque para os papéis do SNI [Serviço Nacional de Informações], resta um volume semelhante dos DOPS [Delegacias de Ordem Pública e Social] nos estados a ser incluído no acervo”. Conforme Jardim, só restaram três dos nove servidores do AN que deveriam atuar no Memórias Reveladas e a responsável por liderar o grupo está de licença médica há seis meses. “A substituição da chefia já foi solicitada por arquivistas à cúpula do Arquivo Nacional”, mas ainda não aconteceu.
Desde o início do governo Lula, o Memórias Reveladas apareceu com destaque no Arquivo Nacional em apenas duas ocasiões. Em 31 de março de 2023, o AN promoveu uma “Conversa sobre o Centro de Referência Memórias Reveladas” e, em junho, a instituição anunciou ter conseguido reverter a desativação da conta da Comissão Nacional da Verdade – que pertence ao acervo do Memórias Reveladas – na rede social Facebook. Tanto o Conselho Consultivo, quanto a Comissão de Altos Estudos, instâncias previstas na composição do Memórias Reveladas, aparecem sem membros nominados no portal da instituição.
Até o fechamento desta edição, o AN não havia se pronunciado sobre as notas da ARQ-SP e da ANPUH-RJ. A instituição também não respondeu à coluna de Lauro Jardim n’O Globo.
#TEMNAPAB
Acesse a PAB e leia estes trabalhos! Siga também no Instagram, Facebook e YouTube.
BRASIL
No último dia 29, o Arquivo Nacional anunciou ter firmado um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com o Ministério dos Povos Indígenas MPI) e a Fundação Nacional dos Povos Indígenais (Funai) para “construir uma política de gestão documental e arquivística com ênfase no direito à memória e às histórias dos povos indígenas”.
Só que… Um dia depois, a Funai publicou a Portaria nº 862, que “dispõe sobre os serviços arquivísticos disponibilizados ao público” pelo órgão. Pela portaria, o acervo arquivístico da Funai compreende a fase permanente, uma flagrante contradição com os ditames da Lei de Arquivos. Algo de errado não está certo.
A Diretoria de Gestão de Documentos e Arquivos do Arquivo Nacional tem novo diretor: Jean Marcel Caum Camoleze foi nomeado no último dia 2. Camoleze é historiador, tem especialização em Educação no Campo e é doutor em Ciência da Informação. Além de docente em escola pública, já foi diretor do Museu Histórico e Cultural e Diretor de Cultura de Jundiaí (SP). Atualmente, Camoleze atuava como coordenador do Arquivo Permanente do Acervo Sueli Carneiro e da Casa do Povo de São Paulo.
A Prefeitura de Belém (PA) espera concluir até o final do ano a digitalização de todos os documentos do funcionalismo municipal. O trabalho está sendo realizado pela equipe do Arquivo Público da cidade.
O Estado do Rio Grande do Sul lançou seu Manual de Redação Oficial. O trabalho é fruto de uma parceria entre o Arquivo Público e a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS).
A Secretaria de Educação do Distrito Federal e o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) foram sancionados pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). A agência entendeu que os dois órgãos violaram disposições da LGPD.
O acervo do ator José Wilker (1944-2014), famoso por sua atuação no cinema e na TV, foi doado para o Museu da Imagem e do Som do Rio.
AGENDA
Estão abertas as submissões para o Seminário Internacional Arquivo e Contra-Arquivo: política e migração das imagens.
Também estão abertas as inscrições para a Diplomatura en Preservación y Restauración Audiovisual.
A ANPD abriu tomada de subsídios para norma sobre direitos dos titulares de dados pessoais. O prazo vai até 4 de março.
Vem aí o Seminário Arquivologia e Redes Sociais Digitais. O evento ocorrerá entre os dias 24 e 26 de abril de 2024. As inscrições começam no próximo dia 16.
OPORTUNIDADES
Concursos públicos à vista para o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, para a Câmara Municipal de Nova Iguaçu (RJ) e para a Prefeitura de Cotia (SP).
MUNDO
O Programa de Solidaridad Utier, que reúne trabalhadores do Instituto de Cultura Puertorriqueña, denunciou a grave situação do Archivo General de Puerto Rico. De acordo com o Programa, os problemas estruturais do prédio que abriga a instituição são tantos que nem mesmo os investimentos anunciados pelo governo devem dar conta da situação.
Por falar nisso, o “novo” edifício do State Archive (o arquivo nacional) da Macedônia do Norte, inaugurado há pouco mais de dez anos, corre o risco de ruir em virtude de um sem fim de problemas estruturais que afetam o edifício. O prédio, a propósito, foi o mais caro entre os construídos durante a remodelação da capital do país. Custou 43 milhões de euros.
O Ministerio de Función Pública da Espanha anunciou o desenvolvimento de um software para ajudar os funcionários públicos do país a redigir documentos mais compreensíveis.
Com a capa provavelmente mais transgressora de sua história, saiu mais um número da brilhante revista espanhola Archivamos.
PARA LER COM CALMA
Caso Bolsonaro expõe travas para preservar rede social como documento público (via Folha de S. Paulo).
Em plena democracia, Abin sonegou informações às vítimas da ditadura (via Correio Braziliense).
Uma entrevista com o historiador Ismaël Diadié Haïdara, responsável pela biblioteca mais antiga da África (em espanhol, via La Verdad).
Reconstruindo os arquivos destruídos pela polícia secreta da Alemanha Oriental (em espanhol, via France24).
Glossário de Proteção de Dados Pessoais e Privacidade (via ANPD).
PARA VER COM CALMA
Políticas e boas práticas para arquivos sustentáveis: alguns desafios (via UCR-CEHR).