Arquivos abandonados no Rio podem ajudar a esclarecer crimes da ditadura
Giro da Arquivo #322 | Documentos estão abandonados em prédio que abrigou IML
Na última terça-feira (01), o portal Intercept Brasil publicou uma série de reportagens intitulada “As fichas esquecidas da ditadura”. Escritas pelo historiador Lucas Pedretti, as matérias repercutem a descoberta de parte fundamental do arquivo do extinto Departamento de Ordem Política e Social, o DOPS do Rio de Janeiro. Os documentos estão abandonados há anos nas antigas instalações do Instituto Médico Legal (IML) do Rio e podem auxiliar na investigação sobre crimes da ditadura.
Composto por fichas de agentes da repressão e dossiês de investigados, o arquivo já era conhecido desde a década de 1990, mas seu paradeiro começou a ser revelado em 2023, quando o Coletivo RJ Memória, Verdade, Justiça e Reparação descobriu onde estão os documentos. Na época, o grupo apresentou uma representação ao Ministério Público Federal, solicitando providências para garantir a preservação e o acesso ao acervo. Em março do ano passado, um inquérito sobre o abandono do prédio onde estão os documentos foi aberto.
Em junho de 2024, representantes da sociedade civil, pesquisadores e ex-presos políticos conseguiram acesso ao local. Os visitantes descobriram, então, que a maior parte da documentação localizada no prédio diz respeito, principalmente, às trajetórias profissionais de agentes da polícia. Em agosto do ano passado, o MPF criou um grupo de trabalho para acessar a documentação e iniciar um processo de averiguação sobre o estado geral e as características dos documentos. A comissão contou com o trabalho de técnicos do Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ) e do Arquivo Nacional (AN).
As reportagens do Intercept Brasil mostram que, além de vasto, o acervo do extinto DOPS pode revelar detalhes importantes sobre a rotina de trabalho de um dos órgãos mais temidos da repressão no Brasil. As fichas encontradas no arquivo revelam a história da carreira de repressores famosos do período, além de mostrarem como a polícia política agia como mecanismo coordenado de controle social durante as ditaduras do Estado Novo (1937-1945) e de segurança nacional (1964-1985).
Abandonados em um prédio inutilizado há anos, os documentos estão bem conservados, mas em condições preocupantes de preservação. Expostos a fezes de pombos e ao contato com ratos, baratas e outras pragas, muitos registros encontram-se em sacos de lixo, jogados no chão. Também não há dimensão exata da quantidade de documentos existentes e nem se os registros sofreram algum tipo de depuração. A força-tarefa estabelecida pelo MPF deve concluir o primeiro levantamento geral sobre as condições do acervo até o final de maio.
De acordo com o Ministério Público Federal, uma solução provisória para o tratamento do arquivo está sendo discutida junto à Sepol. Ao Intercept, o Governo do Rio afirmou ser “relevante a preservação de documentos de valor histórico” e que, “sobrevindo algum documento de efetivo interesse histórico, poderá ser encaminhado ao Arquivo Público para o devido tratamento”. O APERJ, principal instituição arquivística do estado, custodia parte do acervo do extinto DOPS desde os anos 1990.
Para Felipe Nin, do Coletivo RJ Memória, Verdade, Justiça e Reparação, a descoberta do arquivo do DOPS é de fundamental importância para que se possa compreender melhor como eram as entranhas da repressão no Brasil: “A gente sempre teve como contar a história de pessoas que foram perseguidas pela ditadura. Finalmente, a gente vai poder contar a história de alguns personagens que foram importantes para a repressão” – afirmou ao Intercept.
Outros destaques
Terminou na terça (01) a Semana Memórias Abertas, promovida pelo Arquivo Nacional. A programação reuniu uma série de atividades alusivas ao aniversário do Golpe de 1964 e terminou com o evento “Memórias Abertas: Pesquisa, Ensino e Difusão”. De acordo com o AN, o evento “reuniu especialistas para debater o papel da pesquisa e dos arquivos na preservação da memória da ditadura militar no Brasil”.
Apesar da programação, nos bastidores os trabalhos do Arquivo Nacional no que se refere à memória e à história da ditadura civil-militar no Brasil continuam envoltos de complexidades. O Memórias Reveladas, principal iniciativa do órgão, continua esvaziado. Em março, dois dos únicos servidores de carreira do AN que trabalhavam no MR pediram para deixar a função.
Por falar em Arquivo Nacional, depois que o Giro da Arquivo publicou os documentos da seleção de consultores que irão trabalhar no Acordo de Cooperação Técnica entre AN e PNUD, o órgão finalmente disponibilizou os documentos em seu sítio – incluindo, agora, o resultado da seleção para consultor que fará o mapeamento de arquivos comunitários.
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🔰 Brasil
Minas Gerais: MPMG entrega documentos históricos, incluindo carta de Santos Dumont, ao Arquivo Público Mineiro. (R7)
Brasília: Acervo digital de Lucio Costa começa a ser compartilhado com o Arquivo Público do DF. (Agência Brasília)
Brasília 2: Senado elimina documentos antigos e promove gestão sustentável. (Rádio Senado)
Rio Grande do Sul: De discos a cartazes, museu do RS lança campanha para arrecadar acervo do hip hop brasileiro. (G1)
Rio de Janeiro: Universidade restaura imagens históricas de quatro décadas. (G1)
📆 Agenda & Oportunidades
10/04, on-line: Conferência em comemoração ao 52º aniversário da ALA - "Comunidade ALA: Desafios da Arquivística Ibero-Americana".
Até 11/04: inscrições para seleção de professor substituto no Departamento de Arquivologia da UFES.
Até 17/06: prazo para a Convocatória 2025 do projeto Iberarquivos.
🌎 Mundo
Espanha: Ministério da Cultura lança o Platfo, uma grande plataforma digital pública para assistir e aprender sobre o cinema espanhol. (La Vanguardia)
Irlanda: Registros de irlandeses famosos são liberados com a publicação de mais documentos históricos de nascimento, casamento e morte. (Irish Post)
Peru: Archivo General de la Nación – plano de despejo inclui a mudança para o porão do Ministério da Cultura. (Infobae)
Costa Rica: Ivannia Valverde é a nova diretora do Arquivo Nacional. (El Mundo)
📰 Para ler com calma
Anais da XVII Mostra de Pesquisa do Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul. (APERS)
A aplicação da LGPD no setor público é um desastre. (Folha de S. Paulo)
Desclassificar documentos não significa que você possa ter acesso a eles. (Unidiversidad)
Centenário da Universidade Hebraica: o legado de Einstein e o guardião de um ícone científico. (The Jerusalem Post)
📺 Para ver com calma
Sessão Solene: 170 Anos do Arquivo Público do Paraná (TV Assembleia do Paraná)