Acordo entre AN e PNUD continua marcado por pouca transparência
Giro da Arquivo #320 | Dois consultores de projetos já foram selecionados, mas critérios e participantes da seleção não foram publicizados
No último dia 17, a diretora-geral do Arquivo Nacional, Mônica Lima e Souza, designou os servidores Alex Pereira de Holanda e Luana Lobo dos Santos como respectivos diretor nacional e coordenadora do Projeto BRA/23/021, o Projeto de Cooperação Técnica Internacional desenvolvido no âmbito do acordo firmado em 2024, entre o AN e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
O acordo, que tem por objetivo “fortalecer” a Política Nacional de Arquivos e o Conselho Nacional de Arquivos, foi motivo de inúmeras contestações por parte dos integrantes do Conarq. O Giro analisou o assunto (e o acordo) em diversas edições ao longo do ano passado.
A escolha do diretor nacional e da coordenadora do projeto acontece quatorze meses depois da assinatura da parceria entre AN e PNUD. Embora tenha sido por diversas vezes apresentado pela direção do Arquivo Nacional como uma de suas principais ações, o acordo (e as ações nele inclusas) anda a passos lentos. E com pouca transparência.
O acordo original prevê quatro grandes produtos em um valor total estimado em R$ 5,05 milhões. Baseado na contratação de especialistas, o projeto passou quase todo o ano de 2024 sem ações concretas divulgadas. Só em meados de novembro, é que AN e PNUD lançaram os dois primeiros editais para a contratação de especialistas – o primeiro dedicado a selecionar um consultor(a) para atuar em ações estratégicas de territorialização da Política Nacional de Arquivos; o segundo, destinado à contratação de consultor(a) para elaborar instrumento de Mapeamento de Arquivos Públicos no país. Em janeiro deste ano, o AN também iniciou o processo para a contratação de especialista dedicado a elaborar instrumento de Mapeamento de Arquivos Comunitários.
Os dois primeiros processos de seleção lançados por AN e PNUD foram concluídos no início do ano, mas não receberam qualquer tipo de publicidade no noticiário da maior instituição arquivística brasileira. O único local em que constam os nomes dos dois primeiros selecionados para atuar no projeto é o Diário Oficial da União, onde a contratação de ambos foi publicada, no dia 8 de janeiro de 2025.
O primeiro contratado do projeto é Kleber Chagas Cerqueira. Ele receberá R$ 64 mil para entregar dois relatórios, uma ferramenta e uma campanha voltada à atualização do “Mapeamento dos Arquivos Públicos municipais e estaduais” (confira aqui os detalhes da contratação). Cerqueira é historiador e doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB). Em meados dos anos 1980, ele foi estagiário nos arquivos do INEP e da Secretaria de Planejamento da Presidência da República, suas duas únicas vinculações oficiais com o universo arquivístico.
Kleber Chagas Cerqueira concorreu com 114 candidatos. A lista de candidaturas, os critérios de seleção e os resultados do processo não foram publicizados pelo Arquivo Nacional, mas o Giro da Arquivo teve acesso aos documentos através de um pedido via LAI. Cerqueira teve a nota mais alta entre os selecionados (52 pontos). Caberá a ele apresentar os principais resultados dos produtos referentes ao aguardado mapeamento de arquivos públicos estaduais e municipais.
A segunda contratada do projeto é Rachel Lopes Queiroz Chacur. Ela receberá R$ 48 mil para “desenhar” a proposta da chamada Caravana da Promoção dos Arquivos e da Memória. Chacur é graduada em direito e doutora em Ciências Ambientais. Em seu currículo, constam informações de que ela já realizou levantamentos no “arquivo definitivo” do Juizado Especial Cível da UNOESTE. O trabalho foi realizado em 2011. Até ser escolhida para a vaga, a profissional concorreu com 108 candidatos. A listagem completa e os critérios de seleção estão aqui.
Para além da falta de transparência do Arquivo Nacional ao longo do processo de escolha dos primeiros consultores do acordo firmado com o PNUD, chama atenção a pouca vinculação dos escolhidos com temas da Arquivologia – o que, contudo, não chega a ser novidade em se tratando do AN. Também é curioso notar que, apesar de divulgados via Diário Oficial da União, a escolha dos consultores não foi tema das reuniões mais recentes do Conarq – que é parte diretamente envolvida nos produtos previstos pelo projeto.
Outros destaques
A agência de notícias Matinal descobriu que a Prefeitura Municipal de Porto Alegre considera perdido o arquivo da antiga Secretaria Municipal de Obras e Viação (SMOV), parcialmente atingido pelas enchentes de maio de 2024. A Prefeitura teria, inclusive, descartado 40% do arquivo, mesmo sem a realização de avaliação técnica a respeito das possibilidades de sua recuperação. O Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU/RS) e a Associação dos Arquivistas do Rio Grande do Sul (AARS) se manifestaram sobre o assunto – que deverá ser investigado pelo Ministério Público.
A primeira rodada de escolha dos representantes do Poder Público e da sociedade civil que serão indicados para a Comissão Organizadora da 2ª Conferência Nacional de Arquivos pelo Conarq terminou mal para os setores da chamada “participação social”. Em um processo que misturou votos em formulários e até mesmo enquetes de Whatsapp, os conselheiros (que tinham direito de eleger 11 dos 22 membros da Comissão) escolheram cinco entidades da sociedade civil (FNArq, ANPUH, FEPARQ, ANPOCS e Rede Arquifes) e seis do Poder Público (MPU, STF, arquivos do Poder Executivo estadual, AGU, CGU e TCU).
O Arquivo Nacional, a quem caberá escolher os outros 11 integrantes da Comissão, terá apenas três indicações da sociedade civil a seu critério. Isso significa que a Comissão Organizadora da 2ª CNArq deverá ter 8 cadeiras da sociedade civil e 14 do Poder Público.
Além da discrepância entre setores do Poder Público e da sociedade civil, por enquanto áreas importantes (e frágeis) dos arquivos brasileiros estão de fora da Comissão. É o caso das representações dos Executivos municipais e do Poder Legislativo em todos os âmbitos. Complicado, no mínimo.
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🔰 Brasil
Santa Catarina: Arquivo Histórico de Blumenau quer receber acervos particulares. (ND+)
Brasília: Funai assina acordo para criar acervo com registros históricos da relação do Estado com os povos indígenas. (FUNAI)
São Paulo: Arquivo Municipal de Caraguatatuba completa 27 anos. (Prefeitura de Caraguatatuba)
Ceará: Arquivo Público iniciou ações culturais que demarcam os 93 anos da instituição. (Secult/CE)
📆 Agenda & Oportunidades
24/03 a 01/04, no Rio: Semana Memórias Abertas: pesquisa, ensino e difusão.
27 e 29/03: Arquivo Público do Ceará: 93 anos.
UFCA abre inscrições de concurso público para professor - com vaga para Arquivologia.
🌎 Mundo
Estados Unidos: Na pressa para divulgar arquivos de Kennedy, dados pessoais foram vazados. (Folha)
China: país regulamenta uso da tecnologia de reconhecimento facial para proteger dados pessoais. (Brasil247)
Irlanda do Norte: Eventos do Palestinian Sound Archive serão realizados em Belfast e Derry. (The Irish News)
Espanha: A Guerra Civil em 288 gravações inéditas. (La Sexta)
Peru: Instituto Nacional de Saúde Infantil de Breña criará um arquivo histórico após descobrir documentos com mais de 100 anos sobre a construção do Hospital Infantil. (Gob.PE)
📰 Para ler com calma
A recuperação de arquivos atingidos pelas enchentes: a experiência da UFSM e a situação em Porto Alegre. (Sul21)
Reis, piratas e as Cruzadas: 5 segredos dos Arquivos do Vaticano. (National Geographic)
A pandemia de COVID-19 e os Arquivos: qual tem sido o nosso papel? (Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul)
Chica da Silva: Testamento que ficou perdido por 200 anos tem detalhes revelados. (Revista Fórum)
📺 Para ver com calma
Desafios e estratégias na recuperação de documentos arquivísticos danificados pelas enchentes do RS. (Dag UFSM)